FAROFA DA GKAY

FAROFA DA GKAY

criado em: 23:41 2022-12-07

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fonte nexo jornal

A crítica cultural, como exemplificado no caso do evento Farofa da GKAY, muitas vezes envolve o exame das formas pelas quais a sociedade é influenciada e moldada pela mídia e pelo consumo dentro de um sistema capitalista. O conceito de espetacularização, como proposto por Guy Debord, refere-se à transformação de imagens e mensagens em capital, e sua ampla distribuição e consumo sem avaliação crítica. Isto pode levar a uma sociedade que é dominada pelas atuais escolhas de produção e consumo, em vez de um exame crítico destas escolhas. A crítica cultural também frequentemente envolve considerar as dinâmicas de poder em jogo, como a acumulação de capital por um grupo de elite e o potencial de exploração e abuso, como visto no incidente de assédio sexual no evento Farofa da GKAY.

Espetacularização e críticas

O interesse em reality shows e eventos como a Farofa se relaciona com a espetacularização da vida privada, fenômeno que foi estudado pelo escritor francês Guy Debord (1931-1994), o livro “A sociedade do espetáculo”, de 1967, e que está profundamente ligado ao consumo no capitalismo.

Para Debord, a sociedade do espetáculo é aquela onde há acúmulo de capital financeiro, social, cultural e político por parte de uma elite, que também é capaz de acumular a disseminação de imagens e mensagens a fim transformá-las em mais capital. Esses produtos seriam distribuídos massivamente e consumidos pela sociedade sem muito olhar crítico.

“Sob todas as suas formas particulares de informação ou propaganda, publicidade ou consumo direto do entretenimento, o espetáculo constitui o modelo presente na vida socialmente dominante. Ele é a afirmação onipresente da escolha já feita na produção – o consumo.”

Parte das críticas à Farofa gira em torno da futilidade que existiria no evento e em seus convidados a partir dessa espetacularização. Na tarde de quarta-feira (7), havia cerca de 8.000 publicações no Twitter Brasil que faziam menção à Farofa e “futilidade”, segundo análise com a ferramenta Tweet Binder.

Por outro lado, há também críticas que surgem por ocorrências dentro do evento. Na quarta-feira (6), o comediante Tirulipa – filho do deputado federal Tiririca (PL-SP) – foi expulso da festa após ser acusado de assediar sexualmente a influenciadora Nicole Louise durante um jogo.

Tirulipa teria puxado o bíquini de Louise quando os dois faziam uma dinâmica em uma banheira. O comediante não se manifestou sobre o episódio.

O mercado de influência no Brasil cresceu significativamente nos últimos anos, com um número crescente de pessoas usando as mídias sociais para compartilhar aspectos de suas vidas e atrair a atenção dos anunciantes. Há agora esforços para reconhecer e regular a profissão de influenciador digital no Brasil, com pelo menos dois projetos de lei sendo considerados no Congresso. Segundo pesquisa da Nielsen, 39% dos brasileiros dizem seguir pelo menos um influenciador frequentemente, e o mercado publicitário investiu aproximadamente R$ 1,43 bilhão em campanhas lideradas por influenciadores em 2021. A cultura dos influenciadores também teve impacto nas aspirações profissionais de crianças e adolescentes, com 75% dos brasileiros de 8 a 23 anos de idade querendo trabalhar como influenciadores digitais. O desejo de se tornar um influenciador superou as aspirações tradicionais de carreira, como ser astronauta ou médico.

O mercado influencer no Brasil

O mercado de influencers surgiu na década de 2010, com a massificação do uso de redes sociais. São pessoas – em sua maior parte inicialmente desconhecidas – que começam a compartilhar publicamente algum aspecto de sua vida e logo passam a ser vistas por milhares ou milhões de pessoas.

Com o aumento na visibilidade, atraem a atenção de anunciantes e passam a vender conteúdo publicitário em seus perfis e páginas. Se no início da popularização das redes a ascensão de alguns perfis acontecia de forma mais orgânica e amadora, com o tempo isso deu lugar a um mercado robusto. Existem ferramentas, cursos e técnicas para se tornar um influenciador, que se tornou um trabalho almejado por mais e mais pessoas.

Há pelo menos dois projetos de lei no Congresso que tentam reconhecer e regulamentar a profissão de influenciador digital no Brasil. O mais recente é de autoria do deputado Alexandre Frota (Pros-SP), apresentado no dia 23 de maio, definindo como influencer toda pessoa que “se utiliza das redes sociais para produzir, apresentar e divulgar vídeos por qualquer plataforma digital”.

505 mil

é o número de influenciadores no Brasil que contam com mais de 10 mil seguidores e vendem publicidade, segundo pesquisa da Nielsen divulgada em maio

39%

é o percentual de brasileiros que diz acompanhar pelo menos um influenciador com frequência, de acordo com o levantamento da Nielsen

Em 2021, o mercado de publicidade investiu R$ 1,43 bilhão em campanhas capitaneadas por influenciadores a nível nacional. Os dados são do Conselho Executivo das Normas-Padrão), entidade que reúne os principais anunciantes, veículos de comunicação e agências publicitárias do país.

Dentro do universo dos influenciadores, aqueles que dedicam conteúdo a estilo de vida – moda, bem-estar, autoconhecimento, lazer, etc – são os que acumulam mais público e mais dinheiro. Dos 30 influencers mais populares do Brasil, 18 se encaixam nesse segmento, segundo pesquisa da agência Nexxt PR divulgada em abril. Gkay faz parte da lista.

A cultura dos influencers fez mudar também os sonhos profissionais de crianças e adolescentes. Pesquisa da empresa Innova divulgada em março mostrou que 75% dos brasileiros de 8 a 23 anos querem trabalhar como influenciadores digitais. Ideias como ser astronauta ou médico deram espaço para a comunicação digital.

A cultura do consumo, representada pela economia dos influencers, tem consequências negativas para a sociedade, segundo José Luiz Aidar Prado, pesquisador da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Ele argumenta que os influenciadores contribuem para uma "perversão na cultura do consumo" que promete prazer sem fim e incentiva os indivíduos a interiorizar as leis do mercado a fim de satisfazer seus desejos. Isto pode levar a uma desconexão com outros assuntos e a uma dependência de códigos de mídia de plataformas tecnológicas para orientar comportamentos e preferências. Todd McGowan, cientista social e professor da Universidade de Vermont, também vê a economia influente como um reforço das estruturas opressivas do capitalismo e um aprisionamento dos indivíduos em um estado de satisfação incompleta que os impele a buscar constantemente novas e melhores experiências.

Cultura do consumo

De acordo com José Luiz Aidar Prado, doutor em comunicação e pesquisador da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, apesar da popularidade, há um efeito danoso dos influencers no público.

Segundo ele, o trabalho dos influenciadores ajuda a construir uma “perversão na cultura de consumo”, com uma “promessa de prazeres sem fim”, que é mantida com um ar “limpo” de positividade e relaxamento.

“O resultado é uma sociedade na qual todos internalizam as leis do mercado para satisfazer seus desejos e se desconectam de outros sujeitos”, disse em artigo publicado em 2019. “A cultura atual convoca o público a ir atrás de figuras-chaves que promovem o sucesso, dinheiro, felicidade e prazer. Para isso, o consumidor precisa aceitar certos códigos midiáticos vindos das plataformas tecnológicas para saber o que fazer, como fazer e do que gostar.”

Na visão de Todd McGowan, cientista social e professor da Universidade de Vermont, nos EUA, a economia dos influenciadores reforça estruturas de opressão tradicionais do capitalismo.

“Há uma imitação de nossas estruturas de desejo que esconde os traumas que o sistema nos causa. Esse modelo nos aprisiona em uma satisfação incompleta, que nos compele a sempre ir atrás do novo, do melhor e de mais”, escreveu no livro “Capitalismo e Desejo” (inédito no Brasil), de 2016.